Da fazenda Telles Pires, no município de Nova Canaã do Norte, na porção norte do Estado de Mato Grosso, sai uma produção de bovinos que serve de matéria de primeira linha para uma das marcas de carne mais apreciadas por consumidores de grandes centros urbanos, como São Paulo.
“Não teríamos acesso a esse mercado se não fosse um projeto de regularização ambiental, trabalhista e social da propriedade”, afirma o médico veterinário e pecuarista Juarez Soares, 44 anos. O produtor entrega o gado para a marca Rubia Gallega, distribuída nas lojas da rede Pão de Açúcar.
Desde meados de 2015 a propriedade da família de Soares é monitorada com lupa para cumprir as legislações ambientais e trabalhistas, além de promover melhores condições de trabalho aos cerca de 100 funcionários. Soares faz parte de um grupo de quase 1,6 mil produtores brasileiros que receberam apoio técnico da organização não-governamental (ONG) Aliança da Terra e que, desde maio do ano passado, criou sua versão empresarial, a Produzindo Certo, sediada em Goiânia.
Além dos brasileiros, a empresa já atendeu a produtores no Paraguai, na Colômbia e no México, segundo a engenheira ambiental, Aline Maldonado Locks, CEO da Produzindo Certo. “A meta é reunir cerca de seis mil produtores no médio prazo”, afirma Locks.
Na terça-feira (2), o DBO Entrevista falou com Locks sobre o projeto e os conceitos nos quais o trabalho dos produtores estão fundamentados (confira no vídeo abaixo).
DBO Entrevista: “Como fazer a pecuária produzir certo”
Como uma fazenda é mapeada
No caso da fazenda Telles Pires, Soares conta que foi um longo e minucioso trabalho de acertos e adequações. “O frigorífico que entregamos os animais nos recomendou a receber a visita da ONG. No princípio, achamos a ideia um tanto estranha. Uma ONG aqui na fazenda? Isso não vai dar certo. Eles vão revirar a nossa propriedade”, conta Soares. No entanto, assim que os trabalhos da Produzindo Certo começaram, o produtor percebeu a importância do apoio.
Um das primeiras tarefas foi o mapeamento da propriedade, na qual Soares produz grãos em 3 mil hectares em uma área na qual ele produz pasto em rotação de cultura. Essa área de pasto tem 10,5 mil hectares, no qual faz o ciclo completo de 30 mil bovinos, terminados em confinamento.
Na época, ao final do mapeamento foi gerado um relatório preciso do que deveria ser feito na fazenda, para que se adequasse perfeitamente às leis. “Com ele, descobrimos até que preservamos muito mais do que é pedido na lei”. Sua área de matas nativas e florestas é de 26 mil hectares. A preservação na Telles Pires é de 65,8%, quando a lei é de 50% no seu caso.
Explicando: a fazenda está na Amazônia Legal, na qual a lei obriga uma preservação de 80% da área. Mas, segundo o Código Florestal, as fazendas que realizaram desmatamentos nessa região entre 1989 e 1996, obedecendo percentual mínimo de 50% de Reserva Legal, em vigor na época, ficam desobrigadas a recompor suas áreas ao percentual de 80%.
Pelo relatório o produtor identificou ainda problemas no depósito de armazenagem de defensivos e de embalagens vazias. Os técnicos, então, orientaram a criação de um sistema de coleta de resíduos.
“Para o produtor, tudo o que falta é informação do que precisa ser feito e nosso papel foi ajudá-lo a identificar exatamente isso”, afirma Locks.
Um texano no comando
A Aliança da Terra foi idealizada pelo americano John Cain Carter, natural do Estado do Texas. Logo após terminar a faculdade, em 1997, ele se mudou para o Brasil, precisamente para a região de São Félix do Araguaia, em Mato Grosso. Sete anos mais tarde, em 2004, ele funda a ONG.
Segundo Aline, as dificuldades de se produzir em Mato Grosso, à época da chegada de Carter, fez com que ele criasse a ONG para ajudar os produtores a produzir em linha com a proteção ambiental. Agora, com um braço empresarial, a Produzindo Certo deve envolver ainda mais produtores como Soares à causa.
De ONG à empresa
As finanças foi o que mais pesou para a Aliança da Terra se desdobrar numa empresa. “O capital estrangeiro era o que mais financiava as ações, desenvolvidas através de projetos“, diz Locks. “E os recursos estavam diminuindo.”
De acordo com a executiva, como empresa o grupo poderá atuar de forma mais ampla na criação de valor de seus serviços. Tradicionalmente, a Aliança mais ajudava fazendas de grãos, algodão e pecuária. Agora, como empresa vem abrindo outros espaços. Dois novos projetos incluem produtores de laranja, no interior de São Paulo, e de fumo, no Sul do País.
Fonte: Portal DBO