Produtores e indústrias divergem sobre o embarque de animais vivos
A justiça autorizou a exportação dos 27 mil animais que estavam parados no porto de Santos. O transporte do gado para a Turquia tinha sido suspenso de forma liminar pelo juiz federal Djalma Moreira Gomes, atendendo ao pedido da ONG Fórum Nacional de Proteção Animal, mas a polêmica não acabou. O problema gerou divergências entre dois dos principais elos da cadeia da carne: produtores e indústria.
O Brasil é responsável por 15% do mercado mundial de exportação de gado vivo. Segundo dados do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, o Brasil embarcou mais de 400 mil animais em 2017, alta de 42% em relação ao ano anterior. Só pelo Porto de Rio Grande (RS), no ano passado, saíram cerca de 80 mil cabeças para a Turquia – quase o dobro de 2016.
Os criadores comemoram a liberação das exportações e os resultados alcançados no último ano. Eles acreditam que é uma maneira de faturar mais em um momento de preocupação com os preços no mercado interno. O pecuarista Guilherme Fernandes, de São Lourenço do Sul (RS), diz que exporta 100% da produção. O motivo é a melhor remuneração. As raças europeias são as mais procuradas pelos compradores estrangeiros. De acordo com as exigências do mercado, os animais devem ter entre 170 e 180 quilos e não podem ser castrados.
Segundo Guilherme, o aumento das transações internacionais está causando até uma mudança no modo de criação do gado gaúcho, onde se costuma castrar os animais cedo. “O produtor começa a pensar sobre a castração porque países como a Turquia pedem animais inteiros. Esse ano vai ter muito produtor que não vai castrar por conta dessa demanda. É um filão de mercado”, ressalta.
Por outro lado, representantes das indústrias dizem que o aumento da exportação de gado em pé prejudica a cadeia produtiva e gera escassez de matéria-prima. O Sindicato da Indústria da Carne e Derivados do Rio Grande do Sul (Sicadergs) pede que o governo regule a atividade de forma mais rígida e que mantenha a quantidade de embarques nos patamares atuais.
O diretor-executivo da entidade, Zilmar Moussalle, diz que em 2019 o número de animais exportados pode chegar a 250 mil por ano, o que causaria fechamento de empresas e desemprego no estado. “O sindicato é contra a exportação de gado vivo. O Rio Grande do Sul não tem um rebanho suficiente pra abastecer as indústrias. Nós somos mais consumidores que produtores, por isso que vem tanta carne de outros estados pra cá”, afirma.
Zilmar Moussalle também diz que a falta de matéria-prima não afeta só frigoríficos, mas as indústrias de embalagem, farmacêutica e calçadista, entre outras. Ele ainda afirma que há um cartel de compra de animais. “Quem exporta boi escolhe a nata, paga um preço maior, e, no resto que fica, o produtor quer o mesmo preço. Alguns compradores usam barrigas de aluguel, já compram o terneiro antes do nascimento”, completa Moussalle.
Ele também alega que o gado é transportado em condições impróprias e fica mais suscetível a doenças, situação que causaria a morte de muitos animais durante a viagem. “Os órgãos reguladores vão em cima das indústrias para que atendam normas sanitárias rígidas, mas permitem que os animais passem por isso na exportação”, finaliza.
Já para a Associação Brasileira de Angus, as restrições ao embarque de gado vivo ferem as regras do livre mercado. Após suspenção das exportações, a entidade se manifestou em nota dizendo que esse tipo de transação “é uma prática comum, uma atividade lícita e altamente rentável ao pecuarista, que trabalha nos campos com recursos próprios, sem incentivos governamentais, estando à sorte do mercado e suas desventuras”.
Em entrevista ao programa Mercado e Companhia, do Canal Rural, o presidente da Associação Brasileira dos Exportadores de Animais Vivos, Ricardo Barbosa afirma que as regras de sanidade e bem estar animal previstas estão sendo cumpridas. Por causa dos efeitos negativos da suspensão dos embarques na comunidade internacional, Barbosa diz que “o desafio agora é desmistificar a exportação de gado vivo e mostrar que há totais condições de trabalho”. Apesar do problema, ele diz que o setor espera crescer 30% em 2018.
Por Júlio Prestes | Canal Rural