Ao passo que as exportações de carne bovina cresceram 421% entre 2000 e 2019, a manutenção dos mercados compradores da proteína vermelha brasileira segue continua sendo um grande desafio. Além da qualidade do produto, a rastreabilidade da cadeia produtiva, o que atesta sua sustentabilidade em diversas áreas, segue com importância crescente nas exigências dos consumidores. O assunto foi tratado no Giro do Boi desta segunda, 08, em entrevista com Pedro Burnier, gerente do programa de cadeias agropecuárias da ONG Amigos da Terra e coordenador do Grupo dos Fornecedores Indiretos, o GTFI.
Burnier reforçou que a pecuária deve estar sempre à frente das cobranças antes que possa sofrer possíveis punições. “A cadeia da pecuária deve se antecipar a esse problema, estar pronta para mitigar esse risco e garantir a posição competitiva do pecuarista brasileiro nos mercados internacionais. A gente vê que hoje em dia que os varejistas nacionais e de fora estão cada vez mais dando valor em conhecer a origem do produto e o processo de produção desse alimento, quer dizer, como foi produzido esse animal. E aí o próprio consumidor final também tem começado a demonstrar esse interesse”, apontou.
O entrevistado destacou que as cobranças de varejistas e investidores do setor sobre o alimento vão além da segurança alimentar no sentido de inocuidade da carne comercializada. “Você tem uma rastreabilidade muito importante do ponto de vista da segurança desse alimento, mas também os aspectos socioambientais que estão envolvidos dentro do processo produtivo”, afirmou.
“Os próprios frigoríficos brasileiros já começaram também a lançar os programas, exatamente para que tenha uma garantia dessa originação sustentável e maior transparência na cadeia da carne”, listou.
Burnier disse que uma das inovações desses programas de garantia de origem é incluir os fornecedores dos fornecedores dos pecuaristas que vendem gado de corte prontos para o abate. “A gente já vem discutindo dentro desse nosso grupo de trabalho há quase cinco anos essa questão de como chegar a incluir os fornecedores indiretos neste monitoramento da cadeia como um todo. Esse grupo possui vários frigoríficos e associações de produtores, varejistas, banco, enfim, é um grupo de cerca de 20 empresas que já começaram a buscar como seria a melhor forma de fazer esse acompanhamento. E aí as novas iniciativas começaram a aparecer”, contextualizou.
“Dentro desse grupo de trabalho a gente faz uma discussão e começa a fomentar algumas soluções que aparecem, desde plataformas para frigoríficos como outras tecnologias que são colocadas pelo mercado, empresas de geomonitoramento, entre outras. E ocorre o seguinte, tem duas formas (para realizar o monitoramento): uma delas você faz utiliza os dados de GTA e CAR e você faz uma análise socioambiental da fazenda de acordo com a compra desse animal e em outra forma tem as plataformas voluntárias em que os fornecedores diretos convidam os indiretos, de quem eles compram (gado magro), eles fazem a inclusão de seus dados na plataforma com proteção de block chain e tudo mais e com isso, na verdade, o produtor credencia o frigorífico a acessar os dados fornecidos por ele mesmo. […] Isso tudo é uma forma de você conseguir chegar até o fornecedor indireto e dar uma transparência maior na cadeia. Mas por que isso? Existem estudos que demonstram que cerca de 42% do desmatamento ocorreria no fornecedor direto. […] Então é importante também incluir os indiretos porque senão os clientes, o mercado, vai estar sempre correndo esse risco de estar comprando de áreas com desmatamento”, justificou.
“O mercado europeu mesmo começou a fazer algumas sanções a empresas que compram commodities de áreas ou de países com desmatamento”, salientou. “A Europa, apesar de comprar 8% do volume exportado, ela compra produtos de maior valor agregado. […] Vale a pena falar o seguinte: não é só questão da empresa, da sua demanda, o que a gente vê também é que o próprio consumidor está começando a se preocupar mais com alguns aspectos da carne que não sejam aquelas qualidade intrínsecas, que é maciez, sabor, aparência. Ele agora está começando a se preocupar com a qualidade extrínseca, ou seja, de onde vem essa carne, qual a origem dela? […] A origem dela tem algum problema socioambiental?”, ilustrou.
Entre os passos para garantir que a pecuária possa estar à frente das demandas cada vez mais rígidas sobre rastreabilidade da cadeia produtiva, Burnier sustentou a importância do diálogo não só entre produtores de boi gordo e indústrias, mas também entre criadores de gado magro e os invernistas. “Simplesmente eu acho que é ter um bom diálogo com o seu cliente. Quer dizer, os pecuaristas fornecedores diretos dos frigoríficos já têm um relacionamento, já fornecem seus dados, como a própria GTA, que indica onde está a fazenda, tem também o CAR (Cadastro Ambiental Rural) dele e hoje em dia o frigorífico só compra se o fornecedor apresentar o CAR. Mas é importante que os fornecedores indiretos (vendedores de gado magro) também tenham um bom diálogo com os pecuaristas, entre os invernistas e os produtores de bezerros”, valorizou.
Fonte: Giro do Boi